terça-feira, 5 de agosto de 2014

Quando os "anões" proliferam

CLÓVIS ROSSI

Até os mais firmes aliados de Israel começam a fazer a mesma crítica que o Itamaraty fez

Ygal Palmor, porta-voz da Chancelaria israelense, deve estar tendo pesadelos com anões, tal a quantidade de países e personalidades que criticam o que consideram desproporção na resposta de Israel aos ataques do Hamas. Foi Palmor quem disse que o Brasil era um "anão diplomático" exatamente por ter feito esse tipo de crítica.
Agora, vem Laurent Fabius, o chanceler de uma França íntima aliada de Israel, dizer que o direito de Israel a se defender "não justifica a morte de crianças e o massacre de civis". Notou a palavra "massacre"? É a mesma que usou a presidente dos "anões", Dilma Rousseff.
Até a porta-voz do Departamento de Estado norte-americano, Jennifer Psaki, carimbou como "vergonhoso" o ataque mais recente, o terceiro, a uma escola da ONU que abrigava refugiados. E os EUA são o mais firme aliado de Israel.
O secretário-geral da ONU, Ban Ki-Moon, obrigado à neutralidade pelo cargo que exerce, foi mais longe, ao chamar de "ato criminoso" o ataque à escola.
Torna-se assim escandalosamente evidente o que já escrevi aqui (folha.com/no1489355): Israel está perdendo a guerra pela opinião pública global (tema, de resto, da reportagem de capa do número da "Economist" que está nas bancas).
É exatamente o elevado número de civis mortos por Israel que causa a derrota na guerra pela opinião pública.
Escreve, por exemplo, David Horovitz, editor-executivo do "Times of Israel", francamente favorável à invasão de Gaza: "Os corações das pessoas decentes ficam com vítimas indefesas; por muito que Israel tenha sido atacado e ensanguentado, os habitantes de Gaza foram muito mais atacados e ensanguentados --precisamente o que o Hamas tinha planejado".
Pior, para Israel: se está perdendo a batalha por mentes e corações, não parece estar ganhando a guerra no terreno. É verdade que dá por praticamente concluída a destruição dos túneis que o Hamas construiu para infiltrar seus militantes em Israel. Mas Horovitz, um dos mais bem informados jornalistas israelenses, escreve que nunca se poderá ter certeza de que todos os túneis foram encontrados.
Emenda: "Levará muito, muito tempo, para que os residentes das comunidades em volta de Gaza possam dormir tranquilos à noite". Mais: "As lideranças [do Hamas] sobreviveram intactas, escondidas com segurança em bunkers' subterrâneos que construíram nas profundezas do coração de Gaza. A maior parte de seus milhares de lutadores cultores da morte também sobreviveu. Muito de seu armamento está intacto. Tudo pronto, espera o Hamas, para outra, mais perversa, rodada de matanças".
Os números da ONU comprovam que o braço armado do Hamas foi relativamente pouco afetado: dos 1.196 mor­tos já identificados, 1.033 são civis. Se a conta está correta, o Hamas perdeu 163 combatentes, quando tem cerca de 20 mil homens. Como se fosse pouco, há ainda o fato de que o processo de paz com os palestinos, que seria, em tese, a única real solução para o conflito, também saiu ferido, talvez de morte.

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