quinta-feira, 3 de julho de 2014

CLÓVIS ROSSI - Olho por olho até que todos fiquem cegos


A morte de um palestino, se confirmada a vingança, demonstrará até onde vai a semeadura do ódio
Yishai Fraenkel, tio de um dos três jovens judeus sequestrados e posteriormente assassinados por militantes do Hamas, segundo a acusação do governo israelense, teve a reação adequada ao tomar conhecimento de que um jovem palestino, Muhammad Hussein Abu Khdeir, 16, havia sido assassinado, aparentemente em uma vingança promovida por judeus radicais.
"Não há diferença entre sangue e sangue", disse Yishai.
Pena que o reconhecimento de que é insuportável derramar sangue, de jovens ou velhos, de judeus ou palestinos, não seja universal.
Do lado palestino, é notório o fato de que algumas famílias criam seus filhos para matar judeus, em atentados suicidas ou em ações aparentemente isoladas, como a que vitimou o sobrinho de Yishai.
Do lado judeu, a cultura do ódio apareceu claramente na noite desta quarta-feira (2): 35 mil pessoas aderiram a uma página do Facebook chamada "O povo de Israel exige vingança". Entre os aderentes, soldados que nem sequer cuidavam de ocultar as insígnias de suas unidades.
Não adiantou, portanto, recente blog do rabino Gideon Sylvester proclamar que "vingança é uma resposta não-judaica".
Aliás, antes mesmo do sequestro e morte dos jovens, um movimento chamado "Price Tag" (Etiqueta de Preço, em tradução literal) promovia ataques a palestinos e suas propriedades, sem que as autoridades dessem a devida resposta.
Tanto é assim que o relatório sobre terrorismo do Departamento de Estado incluiu este ano, pela primeira vez, o "Price Tag", citando contabilidade da ONU que dá conta de 400 ataques em 2013, "em grande parte sem a devida punição".
Até a Liga Anti-Difamação, ativo movimento de defesa dos judeus contra ataques (físicos ou verbais), "condenou fortemente", em comunicado oficial, a possível vingança cometida contra o jovem palestino, bem como "um alarmante surto de chamados incendiários pela vingança de parte de alguns israelenses".
Para os palestinos, esse "alguns israelenses" é uma maneira de diminuir a importância do "surto de chamados incendiários". Escreve, por exemplo, Daoud Kuttab, jornalista palestino e colunista do site "Al Monitor", que não é anti-semita, ao contrário do que pensam alguns judeus sempre que alguém critica políticas do Estado de Israel:
"Algumas das piores reações ao desprezível ato de matar adolescentes israelenses vieram de políticos e de gurus. Quando a incitação vem do topo do governo, não é surpresa como o resto da população age".
A semeadura do ódio tem uma evidente tradução política, como escreve Ahmad Samih Khalidi, pesquisador em Oxford e ex-negociador palestino:
"À medida que toda a região entra em uma fase de profunda incerteza e severos desafios securitários, o rompimento total das relações palestino-israelenses somente acentuará a dificuldade de reconciliar as demandas essenciais de cada lado: a segurança de Israel e a soberania e liberdade palestinas". Ou, se você preferir o Mahatma Gandhi, "olho por olho, e o mundo acabará cego". Folha, 03.07.2014
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